tempo(s)


Estamos num cenário de guerra mundial.

Literalmente, mascarando medos. Fragilidades.

Vulnerabilidades.

Para não enlouquecermos, fingimos que está tudo bem, como a frase que nos foi formatada.

"Vai correr tudo bem"

Mas se paramos para pensar, os fantasmas começam a parecer reais.

Numa das minhas mãos, cerrada, guardo as munições.

Na outra, aberta e vazia, anseio pela poesia que me foi cativa.

Percebo então, que não estás ao meu lado nas trincheiras.

Numa guerra real, atormenta-me mais que a morte, saber que és imaginário.

E a lucidez nestes momentos é avassaladora.

Tento ludibria-la

Mas ela é astuta.

Ganha-me, mesmo quando a tento anestesiar.

O mundo está doente, meu amor.

Não há lugar para florear.

Não há perfume

Não há tempo para existir tempo, daquele que flui à margem de um rio que corre

Que segue o seu curso.

Em paz

E sem tempo....

Não existimos.

Que horas são?

Foi apenas um sonho mau.

o toque

 

In Facebook


O Freddie, provavelmente começaria assim:

"My beautiful people

My darlings

My dears friends.."

Isto sou eu a imaginar.....

Aqui, no mundo da "Cristina Isabel"

Eu começo assim:

SOL

Que haja sempre Sol em nós

A tal palavra mágica

O tal código de amor

Aquele, onde aqui e agora, sabemos que todos os dias são renovações de esperança.

Por aqui, aprendi que darmos de nós, não é muito usual numa rede social

Temos os diários e temos os psicólogos

(Aqui é a parte onde sorriem)

E ter a loucura de expormos o que sentimos ao "mundo" é algo de muito parolo, talvez

Mas quem quer saber?

Esta década de redes sociais, foi a melhor expressão de mim em vós

Fui crescendo com o bom

Mais ainda com o mau, destas coisas

Há sempre o reverso da medalha, não é?

E hoje é o tal dia....

O dia em que porque o calendário o diz, há que parar e refletir

Foi uma honra.

Diverti-me tanto com cada um de vós

Aprendi a conhecer-vos como conhecia os clientes do quiosque do meu Bairro.

Mas isto faz parte de mim

Não ter medo de me deixar cativar

E já sabem o que aconteceu à raposa.

Isto para vos dizer, que o ano de 2020 nos privou do que para mim, é o mais importante da vida.

O toque.

O sentimento transformado em gestos de afecto.

E não obstante, foi um ano de recomeço

Lembrem-se que cada dia é uma folha em branco

Não permitam nunca, que ninguém a assine por vocês

Até já

Feliz Ano Novo

fragilidades


A vida pode ser tão fascinante, se pararmos e a olharmos de frente.

Olhos nos olhos.

Sem medo.

Engraçado como quando nos sentimos mais frágeis, vem alguém do nada e nos diz que somos Amor.

E do lado de lá nem percebem como nos sentimos do lado de cá.

Um Amor que resiste em nome de vidas que não as nossas.

Que vos fala de poesia e de sol, quando vive no inverno.

Ou no inferno.

Já nem sei.

Sei que todos somos importantes.

E que as aparências não passam disso.

De algo ambíguo em que talvez queiramos acreditar.

Difícil é perceber que somos feitos de pedaços de fragilidades e fingimos ser invencíveis

E quando decidimos ir embora, alguém bate no nosso ombro e nos diz:

"Preciso de ti"

E é por isso, que fico sempre.

Enquanto alguém precisar de mim, eu irei estar.

Serei invencível.

Enquanto o conseguir ser

estimação

 

Sempre gostei de animais

Desde que me lembro de ser gente que vivia rodeada de gatos e cães, que habitavam a rua da minha avó.

Um dia deveria eu ter uns 9 anos, uma gatinha de rua teve uma ninhada.

Eu vi pela primeira vez o milagre do nascimento.

Sim que a gata apesar de ser de rua, foi nesta miúda que confiou para assistir ao parto.

E fiquei tão feliz, mas tão feliz, que quando o meu pai chegou a casa, só conseguia falar dos gatinhos.

Queria dividir a minha alegria com ele.

Mas o mundo dos adultos não se compadece com o dia-a-dia de uma criança e o meu pai falou-me muito mal.

Disse que parecia gostar mais de animais do que de pessoas.

Que estava farto de me ouvir falar de coisas que não tinham importância.

Magoou-me tanto

A minha felicidade desvaneceu por completo e fui para o meu quarto chorar sozinha.

Não lhe disse nada

Mas desde esse dia não voltei a partilhar com ele, "coisas sem importância"

E ele sentiu que eu tinha mudado.

Mas não me disse nada

Quando fiz dez anos, tinha uma caixa no chão

Não fazia ideia do que seria aquilo.....

O meu pai tinha encontrado uma cadela bebé para mim

A minha Filó que me acompanhou durante o tempo em que foi viva

Isto para vos dizer, que por vezes nos magoamos no nosso dia-a-dia

Em regra só nos magoam as pessoas que amamos

Naquele dia perdoei-lhe a tristeza de meses

E ele sabia disso

Não precisávamos falar no assunto

No final da vida do meu pai, foi ele que encontrou um gatinho de rua.

Um dia fui lá a casa, e ele já cheio de dores, tratava aquele gato com um amor inexplicável

Nunca me irei esquecer.

Retomei aos meus 9 anos

O meu pai estava lá...

E brincava comigo

hêrmania e as hortênsias

Hêrmania.

Com H e acento circunflexo .

Assim como as hortênsias.

Repetia o nome da minha avó, sempre que alguém me o perguntava.

Ninguém o escrevia bem, numa primeira tentativa.

E se a pudesse descrever em poucas palavras, era assim.

Como o seu nome.

Sui Generis.

Única.

Em frente ao alpendre, onde me sentava com ela, nas noites de estio, estava um canteiro pequenino, e ocupado em toda a sua extensão , por hortênsias azuis.

As nossas flores azuis.

Achava eu, fazendo a analogia ao Pequeno Príncipe, que não existiam no mundo Hortênsias azuis como as da Hêrmania.

Anos e anos mais tarde, quando cheguei aos Açores, achei que a minha avó tinha lá ido plantar as nossas flores azuis.

Durante anos vivi com ela.

Dormíamos no sótão, (a divisão melhor da casa, poi estava mais perto das estrelas) .

E ela ressonava a noite toda.

Gradualmente habituei-me aquele respirar sonoro, e ainda hoje, acordo de noite e sinto saudades daquela espécie de melodia, como se uma luz de presença fosse, e me apaziguasse os medos.

A cozinha era um laboratório diário.

Eu dizia que a minha avó era a cientista das magias.

Os pastéis de molho que saiam daquele espaço, levavam a que o bater na porta, fosse constante.

Ainda hoje, guardo o cheiro, o sabor, a dedicação e o amor, naquele trabalho que a permitiu sustentar uma família.

Recordo uma véspera de natal.

Dentro da casa, onde existiam as hortênsias, era um entra e sai de gente.

A consoada era preparada.

A família chegava.

Eu lembrei-me de percorrer a pé o meu bairro.

Sozinha.

E foi um percurso de eternidade.

As ruas estavam desertas e eu sabia, que havia uma casa, com um pequeno canteiro, onde lá dentro me esperavam.

Onde eu era feliz.

Não estava sozinha.

E naquela noite, aquela menina, percebeu o que era o natal.

Guardo no meu coração tudo o que foi bom de guardar.

Do bairro do amor, das paredes daquela casa.

Das nossas estrelas vó.....

Hoje os papéis inverteram

São os meus filhos que um dia irão perceber, que eu estarei aqui.

Hoje sou eu a adulta.

E as saudades que tenho de .... só por um dia.... voltar ao teu abraço.

Ao cheiro da tua cozinha.

Regar as nossas hortênsias.

E saber que ali, no outro tempo, me amavas incondicionalmente.

Só porque sim

Porque fazia parte de ti.

E esta é a definição de amor, que deixo para o vosso domingo.

Que haja sempre alguém na nossa vida, onde tenhamos vontade de regressar a.....

Que haja sempre um canteiro de flores azuis.

E alguém que espere por nós.

Porque é assim que a vida faz sentido.

diários de uma non sense girl

Treze de Novembro do ano de 2013 depois de Cristo. Acordo com uma nesga de luz, de um sol tímido e frio que insiste em brincar com o emaranhado dos meus caracóis despenteados.

Acho que a minha alma também acorda assim. Desarrumada.

A casa ainda dorme.

Curioso como me deito com ela, a casa, a dormir e assim desperto.

Como se fosse assim que faz sentido.

Hoje, como em todos os dias desde que me lembro de ser gente, sinto-me uma espécie de autista.

Num mundo onde não pertenço. Que não é meu.

Mas hoje é um dia de Outono daqueles em que as árvores vislumbram umas cores que inspiram à poesia.

Em que a natureza me lembra que tudo é cíclico, que as cores vão passar e o Inverno vai chegar.

Mas hoje é um dia de Sol também.

E a folha em branco urge em se escrever.

Tanta tarefa atrasada. Tantas responsabilidades.