uma senhora

 

Uma senhora não é aquela que usa saias compridas e vai à missa todos os domingos.

Não é só.

Uma senhora pode vestir saia curta. Pode falar com Deus em todo o lado.

Pode se expor sem medo do ridículo ou de a julgarem, sem ter de reprimir sentimentos.

Pode ousar, pode ser divertida, pode inclusive ser ela própria , sem ponderar se nem sempre é contida no que diz.

Uma senhora não tem que ter idade.

Uma senhora pode ser uma eterna menina, despudorada, sem que a apelidem de louca ou depravada.

Uma senhora pensa por ela. E sabe que mentes pequenas pensam pequeno.

Uma senhora não leva portanto a mal que não percebam o que distancia ser genuíno de ser vulgar e como senhora sorri.

Deixo um sorriso.

 

guardo em mim

 

Engraçado como guardo ainda tanto de ti.

Meu amor. Soa estranho ainda escrever este “meu amor”, mas nunca o deixaste de ser.

Intuía que o tempo desbotasse um pouco as cores da memória, como faz a água com a roupa de cor, após lavagens sucessivas.

Pensei que o tempo desgastava sorrisos e fragmentos de felicidade que tivemos.

Mentira.

Hoje mudei de perfume. Ninguém deu por nada. Pensei então em ti, como faço por tudo, ou por nada.

Lembrei-me de pequenas coisas que me surpreendiam em ti. Como só tu notares essas pequenas nuances.

Frisson de alma.

Como quando me cantavas ao ouvido “My China Girl” . Como quando cantavas para mim.

A minha parte sonhadora ainda me diz que existes assim.

Como só eu te via.

e depois do adeus

Teatro.

Estava sozinha e ouviam-se músicas revolucionárias.

Mandei-te uma SMS. Dizia que te amava e o quanto desejava ter-te ali ao meu lado.

Juntos. A ouvir a mesma música.

A criar memórias.

A música ia tocando e eu estava absorta naqueles fados tristes, que conquistavam a também tristeza alma minha.

Apareces. E sentas-te ao meu lado.

Toca o “E depois do Adeus”.

A nossa primeira vez ali.

Quase profético.

A nossa última vez.

“Teu lugar a mais. Tua ausência em mim”.

Sabia naquele momento que ali se tinha eternizado uma memória.

Adeus era uma palavra proibida.

Tu, eras apenas uma enorme mentira.

eu e tu

 

Naquela noite a roçar a madrugada, sai da discoteca e entrei no carro.

Tinha desligado o telemóvel para não estar em contacto contigo.

Com ninguém. Queria sentir aquele Remember. Rever caras antigas. Reviver.

Acabei por me sentir sozinho. Genuinamente sozinho no meio de uma gente que já nada me dizia.

Entrei no carro e passei os olhos pelo telemóvel como te procurando nele.

Estavas lá. Como estavas sempre.

Estavas ali, do outro lado, à minha espera.

Sorri.

Hoje, sei que já não estarás mais daquele lado.

Não existirão mais madrugadas em que te encontro, onde ainda te procuro.

Eramos um “encaixe quase perfeito” neste mundo real.

Hoje és real.

E estamos sozinhos.

vida

 

De quando em vez questiono a minha maneira atípica de ser. A verdade, é que por vezes tento mudar extremos, mas não consigo. Tenho sede de viver como se a vida se esgotasse a cada dia. Não sei porque sou assim inquieta mas se viemos ao mundo, Talvez fosse com o intuito de que valesse a pena a nossa presença nele. Com a condição Sine qua non de nos obrigarmos a ser (barra fazer) felizes, e quem connosco habita neste mundo por vezes tão hostil. Talvez por isso me obrigue de forma consciente a exercitar a mente No sentido de não parar de me instigar e de me provocar estímulos Em todas as camadas do meu ser. Não sei. Sou um gigantesco ponto de interrogação ainda em ecstasy com isto da vida. Sei que é bom colocar um sorriso nos lábios do outro. E sentir que só um leve rasgo desse sorriso a nós pertence. Não sou crente, no obstante quando penso no dia da minha morte Gosto de imaginar um majestoso altar celeste coberto subtilmente por um inocente céu azul. Que nos aguarda e nos recebe. Céu esse que, de noite se cobre de estrelas e com sorte algumas parece que caem. Diz a lenda que quando isso acontece devemos pedir um desejo. Desde que me lembro de me lembrar de pensar e de fazer estas coisas Estas coisas de falar com as estrelas O desejo é o mesmo. Devemos ser felizes. O mais é mesmo menos.

Isto de viver é uma curta-metragem....que o argumento seja bom.

 

chegou a primavera

 

Dizem que quando morre uma andorinha, não acaba a primavera.... Mas então porque me sinto neste estado de alma sem ti? Tu partiste e a primavera partiu contigo da minha vida. Já nada é florido como outrora nem tem perfume. Não o nosso. O perfume dos nossos corpos entrelaçados. O perfume do nosso amor. Todos os anos agora, aguardo que a nossa roseira desabroche. Renasça. E ao faze-lo te traga de volta para mim. Mas tu já não vens meu amor. Alguém te arrancou de mim e contigo levou a minha alma. E eu insisto e espero a cada nova primavera que renasças na nossa roseira em flor. Eras a minha rosa azul. Preciosa. E como eu cuidava de ti. Nem me apercebia que existiam mais flores no meu jardim. Dediquei-te o meu tempo. Mais que isso, dediquei-me a ti. Mas alguém insistiu em te arrancar e matou-nos aos dois. Ao nosso amor. Chegou a primavera. Mas tu não estás aqui.

procura-me

 

Não me procures por entre a gente que passa.

Não me irás encontrar por lá.

Se realmente me quiseres encontrar

Procura por entre a brisa que brinca com o teu rosto

Procura por entre os raios de Sol que te trespassam o corpo

Te aquecem

Procura em cada cicatriz minha

De pele

De alma

Procura em cada sorriso que trocámos

Procura na nossa cumplicidade

Sem palavras

Num aroma que te lembre de mim

Numa música que passe

Procura-me num fim de tarde

saudades

 

Saudades tuas meu amor.

Saudades de como sorrias para mim, e me fazias pensar que só sorrias assim para mim.

Saudades do teu olhar fixo quando me olhavas.

Saudades de cada beijo teu, onde percebia o quanto te amava.

Saudades da forma como fazias amor comigo.

Dança de corpos, onde as almas se entrelaçavam , suave e intensamente.

Saudades de encostar a minha cabeça no teu ombro e o tempo cristalizar.

Saudades de cada toque.

Saudades dos nossos silêncios, onde dizíamos tanto neste mundo autista de sentir.

Saudades de um presente que virou passado, sem futuro.

Se sentisses em ti a ausência em mim, entendias como ficaste entranhado na minha história.

like a rock

 

Fluis nos meus pensamentos como a água do rio que vai desaguar no mar. De uma forma pura e natural. Há dias lestos em passar, quando revejo no nosso amor a fortaleza de uma rocha. Imponente e imune a todas as intempéries que sobre ele se debatem. Permanece ali altiva a proteger a sua serra. Parece que nada a abala. Assim revejo eu o nosso amor. Like a Rock. Dias há, soturnos, em que revejo no nosso amor a travessia de uma andorinha. Que foge do frio regressando sempre na primavera. Inconstante e no obstante regressa sempre. Como se o nosso amor fosse o calor que a faz voltar onde pertence. Não sei meu amor, se o que sentimos é forte como uma pedra, frágil como uma andorinha. Sei que permanece. Enquanto houver vida em mim.

camadas

 


Amor, apareceu-me algo no cérebro.

Dizem os especialistas que é um tumor.

Algo que irá alastrar e destruir as “camadas”, dentro delas aquelas em que eu penso em ti (tanto)

Dizem que tenho pouco tempo.

Todos nós morremos. Agora eu sei do que provavelmente morrerei eu.

Talvez isso explique esta agitação que tenho sentido.

Esta pressa de viver e de sentir.

Pensamentos que se confrontam querendo sair fora das camadas e se estender .

Estender para fora o que está dentro (alma)

No campo das probabilidades, talvez um dia se lembrem destes pensamentos e não pensem em mim como uma folha em branco.

Pensem num ser humano bom que existiu e isso basta-me.

Quanto a nós amor, nada me basta.

verde

 

Domingos Araújo.

Professor de Filosofia que veio de Braga dar aulas na minha escola.

Pronúncia engraçada.

Loirinho e pequenino.

Olho verde.

Corrigia os testes a verde.

Eu tinha 15 anos e despertava em mim o gosto pela filosofia e pelas coisas da escrita.

Comecei a escrever os testes a verde.

O professor usava uma caneta vermelha só para mim.

Era o nosso segredo.

Um dia resolve corrigir o teste com variadas cores e deixa-me um post scriptum:

"Todas estas cores são metafóricas e representam uma tentativa frustada de compreender a razão do seu verde".

Sorri ao ler.

Ele encolheu os ombros e comentou: "Não percebeu".

olhar(es)

 

Giro como os meus olhos encontraram os teus. Assim meio perdidos, meio tristes, meio silêncio que quer rasgar e libertar o som que vem de dentro. Na verdade, a primeira vez, a nossa primeira vez, foi um reconhecimento. Finalmente estavas ali à minha frente e fiquei voluntariamente presa naquele olhar agrilhoado. Passei, desde esse dia, a ver-te em cada olhar que por mim passava, em cada sorriso, em cada vulto que te assemelhava. E tornaste-te na minha inspiração diária. És a música que toca dentro de mim a cada instante. A loucura do meu racional. És a minha poesia. Já não saberia viver, sem a tua alegria, Meu amor, como viveria eu agora sem esta parte? A parte em que tu e eu somos um. Almas entrelaçadas Ensina-me então, a esquecer-te. Melhor. Esquece de me ensinar a não amar-te.

vida(s)

 

Ainda não percebi o que se passou comigo.

Há umas décadas atrás era tudo tão diferente.

Fui feliz.

Era bonita.

Casei.

Tive dois filhos.

Objectivos.

Sentia que a vida fazia sentido.

Mas o tempo foi passando.

Também passou por mim.

Envelheci.

Hoje ninguém olha para mim.

Não como olhavam outrora.

O cabelo ficou grissalho.

O corpo amarrotado.

labirintos

 

Ainda me desarma esse teu sorriso amor.

Como se fosse a primeira vez que o fizeste e ao fazê-lo me prendeste nele.

Como quando te conseguia ver sorrir de olhos fechados, em mim, e me apaziguavas o coração só de imaginar-te.

Via em ti um menino tímido cativo num corpo de adulto soturno, e com o tempo aprendia-te.

Cada vez que sorrias, o sol brilhava mais forte, como a dizer-me que eras verão em mim.

E cada vez que sorrias eu devolvia-te um sorriso de volta, como quem retribui pedaços de afecto.

E deste-me asas amor, de cada vez que percebia que contigo era feliz.

Sei que a vida é um eterno enigma, nem sempre percebemos porque existe quem fica nela e quem vai embora.

Quem passa por nós sem nada deixar, e quem vá e deixa saudades.

Amar alguém de forma pura, a quem damos apenas sorrisos, porque temos vontade de sorrir, é um privilégio.

No obstante, existem em nós encruzilhadas, como quem caminha num labirinto manipulado sem saída aparente.

travessia

 

O tempo passou por nós amor Ou nós passamos por ele, Como quem saboreia um chocolate quente num dia frio. Nem demos conta. E ao passarmos, nós e o tempo, Um pelo outro Fomos somando vida à vida que tínhamos antes de haver um nós. Enriquecendo-nos com as somas da vida no seu tempo. Ao partilharmos, ao sermos cúmplices aprendemos a valorizar a travessia que é a existência humana como algo que transcende a morte e o fim. O fim é algo que não interessa mais. A vida é breve e há amores que se demoram nela, diluindo-a e prolongando-a Como quem olha para o horizonte e tenta destrinçar céu e mar que se misturam e nos confundem o olhar. Amo-te. Enquanto houver vida em mim E mesmo que sendo breve já é longa e imensa ao teu lado. Vale pela travessia.

triste

 

Hoje queria ter sido forte. Forte o bastante para segurar as lágrimas que me corriam pela face. Gostava de ter tido a capacidade de olhar-te nos olhos e fingir que era feliz. Sorrir-te apenas. Mas tu conheces-me. Contigo não sei ser quem não sou não é? Há momentos nas nossas vidas que apenas não conseguimos mais segurar a máscara da fortaleza, e as fragilidades caem em camadas como pássaros em cativeiro, agora num céu aberto e infinito. Tento entender o que se passa. Entender-me. O que sinto. E hoje, hoje só consigo dizer-te que estou triste. Como quando chega o outono, num prenúncio de inverno anunciado. Perdi em mim uma série de sonhos que havíamos conquistado, e hoje nem me apetece acordar, na vã esperança de resgatar esses sonhos enquanto durmo. Perdi a vontade de cantar, como outrora, sem motivo, ou pelo motivo maior de estar feliz. Como quem se esquece das letras e não conhece mais as músicas. E a poesia amor, a poesia que te dedicava, secou, como tinta ressequida com o calor do sol. Não consigo mais escrever. Perdi a poesia que vivia em mim. Hoje queria ter sido forte. E dizer-te apenas que te amo e não desisto.

desapego

 

Há umas décadas atrás

Sem que eu desse conta

Ramificou na minha alma

Um jardim onde proliferavam

Flores do desapego.

Umas flores sem cor

Sem cheiro

Que viviam da falta de luz

Da falta de calor humano

Viviam da frieza dos sentimentos.

Dei por mim a evitar os abraços

Os apertos de mão

Os beijos

Evitava criar laços.

Talvez tivesse sido

hoje

 

Hoje passei por ti mas não te vi.

Hoje passaste por mim, mas não me viste.

Passámos ambos, um pelo outro.

Ambos alheios a nós. Indiferentes.

Só olhando à nossa volta.

Passaremos muitas vezes mais

Um pelo outro.

De todas as vezes não mais nos veremos.

Não como olhávamos outrora.

Passaremos.

Apenas.

Um pelo outro.

Suceder-se-ão os Outonos

Somá-los-emos na nossa vida.

Não mais existirá aquele Outono

a vida não é uma droga

 

Quinze anos.

Necessidade de abarcar o mundo na palma da mão.

Sentir. Sentir muito.

O tempo urge.

Vontade de conhecer, de querer, de saber.

Sentir as emoções até roçar o limite.

Velocidade. Loucuras.

Tudo faz parte.

A fronteira entre o bom e o mau

É ambigua

Hoje somos felizes

Amanhã miseráveis.

Somos um mar agitado

De sentimentos divergentes.

Adolescentes.

hora(s)

 

Quando a nossa hora se aproximava

O meu coração dessarrumava-se

Como que agitando a alma

Num reboliço constante

Assim como quem transborda de felicidade

E não existe mais espaço

Para espaços arrumados.

Nessa hora instalava-se o caos emocional

E por uma hora o mundo parava

E amavamo-nos como se as outras horas

fossem meros fragmentos de tempo sem importância.

Aqui e agora no meu relógio essa hora não passa mais.

Como que quando ela chega

Em mim se cruza um buraco negro

Um buraco a céu aberto onde o tempo cristalizou.

despedida(s)


Resolvi escrever uma cena. Pelo dia de ontem e porque me apeteceu. Partilho-a com os meus amigos. Bom domingo.

Todos os dias me despeço de ti

Como se não existisse mais nascer do sol

Nem mais anoitecer.

Como se houvesse chegado ao fim da linha da nossa história.

Ou mesmo de uma das nossas vidas.

Nem sei porque o faço.

Digo-te sempre adeus

Como nunca o faço a mais ninguém.

Há muito que és a excepção das minhas regras

Por mim impostas.

Para todos um até já.

Para ti um adeus constante e diário.

Fui dentro de mim procurar a resposta

me

 

Amálgama de Eus

Que se misturam entre si.

Me baralham.

Me confundem.

Se diluem entre um princípio e um fim.

Quem sou eu afinal?

Que raio faço eu aqui?

Por vezes Sol brilhante

Imenso

Por vezes Sol soturno

Tímido

Obscuro

Moribundo

Distante

Ausente

porque te amo eu assim


Nunca te devia ter olhado nos olhos uma primeira vez.

Nesses olhos tristes.

Acutilantes que me rasgam a alma e me desnudam o ser.

Olhei e fixei-me neles.

Apaixonei-me.

Mea culpa.

Capitulei-te.

Agora é tarde para voltar ao ponto de partida.

Aquele ponto em que te olhei nos olhos uma primeira vez

Como que um ponto de exclamação.

Já fazes parte de mim.

Fazes parte de mim com um parêntesis

Que mais parece um ponto final.