desapego

 

Há umas décadas atrás

Sem que eu desse conta

Ramificou na minha alma

Um jardim onde proliferavam

Flores do desapego.

Umas flores sem cor

Sem cheiro

Que viviam da falta de luz

Da falta de calor humano

Viviam da frieza dos sentimentos.

Dei por mim a evitar os abraços

Os apertos de mão

Os beijos

Evitava criar laços.

Talvez tivesse sido

(Pensei eu)

Uma auto-defesa

Uma antecipação

De uma futura mágoa

De uma futura perda

De um presente apego.

Não me apegando a ninguém

Não sofreria na despedida.

Era simples a fórmula.

Com o tempo decidi arrumar a alma.

Uma espécie de limpeza...

Descobri então que a flor do desapego

Tinha ocupado todo o seu interior

Retirando o espaço ao amor e à amizade

Lotação esgotada.

Percebi que no interior da minha alma

Faltava o SOL

E a falta de luz e o frio dos sentimentos

Mantiveram a flor viva

Fizeram-na sentir-se em casa...

Como um hóspede

Com um convite vitalício

De hospedagem.

Abri de imediato as janelas

Deixei a porta aberta

E a alma respirou fundo...

O SOL entrou devagarinho

E com ele a flor foi murchando

Até que deixou todo o espaço vazio...

O amor e a amizade regressaram a casa

Ao lugar onde pertenciam

Bem junto ao coração

Hoje em dia já não viro as costas a um abraço

Já não evito um beijo

Um carinho.

Se me magoar?

Se me desiludir?

Terá valido a pena.

Terei vivido.

Terei sentido.

A flor do desapego?

Neste jardim não mora mais

Não consegue sequer entrar

Pois o SOL ofusca-lhe

A entrada.

Foi uma viagem sem retorno.

As janelas vão permanecer abertas

Mas só para entrar a luz

E o calor...

Enquanto existir amor no meu coração.

E uma réstia de SOL

No horizonte.

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